Não são apenas os acidentes de trabalho os principais responsáveis pelo afastamento de profissionais de suas atividades. Além de fraturas em pernas, punhos e braços, as dores crônicas na coluna e articulações e doenças psiquiátricas estão entre as que mais geram incapacidade para o trabalho, conforme dados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) em Bauru.
Segundo o órgão, somente neste ano foram concedidos na cidade 2.277 pagamentos de auxílio-doença – benefício concedido pelo Ministério da Previdência Social a quem recebe atestado médico por mais de 15 dias consecutivos. Afora os problemas ortopédicos, trabalhadores com distúrbios mentais como depressão, esquizofrenia e síndrome do pânico frequentemente precisam se afastar de suas funções para receber tratamento. Em 2011, o pagamento do benefício em Bauru já gerou custo de R$ 2,2 milhões aos cofres públicos.
O afastamento por patologia ortopédica, na maioria das vezes, atinge profissionais que desempenham atividades que demandam esforço físico ou posturas antiergonômicas, como é o caso do setor da construção civil. Já a incapacidade devido a doenças psiquiátricas predomina em grupos de trabalhadores que desenvolvem atividades administrativas ou de vigilância.
Uma das causas mais frequentes de afastamento em anos anteriores, o Distúrbio Osteomuscular Relacionado ao Trabalho (Dort, também conhecido como LER e provocado por movimentos repetitivos que podem provocar lesões em tendões, músculos e articulações) é um problema que vem sendo contornado, embora ainda seja uma ameaça aos trabalhadores e às empresas. “Observamos diminuição da incidência de benefícios concedidos por Dort a partir de 2007, talvez devido ao aprimoramento da atuação das empresas na prevenção dessa patologia”, considera Marina de Oliveira Fernandes, chefe médica do serviço de saúde do trabalhador do INSS de Bauru.
Em lugar desta disfunção, outros problemas ortopédicos como lombalgias (dores nas costas), hérnia, artrite e artrose, entre outras doenças articulares, tomaram a frente do ranking junto às fraturas provocadas por acidentes de trabalho. No aquecido setor da construção civil, por exemplo, o índice de afastamento por estes motivos sofreu uma sensível elevação, conforme aponta o presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil e do Mobiliário de Bauru, Cláudio da Silva Gomes.
“E não foi apenas pelo aumento do número de trabalhadores, mas também pelo aumento da quantidade e do ritmo de trabalho. Os autônomos estão aproveitando o momento para assumir o maior número de contratos, enquanto os que são empregados se veem forçados a cumprir prazos menores para suprir a carência de mão de obra em outras obras”, detalha.
Mente em xeque
Mas, ainda que as doenças ortopédicas sejam um problema grave para a atividade econômica, os distúrbios psiquiátricos estão afetando cada vez mais a classe trabalhadora. Seja por inadequação ao cargo assumido ou à filosofia da empresa, passando pela dificuldade em lidar com as pressões do mundo corporativo, as doenças mentais podem desencadear quadros considerados graves, entre eles síndrome do pânico, depressão e até esquizofrenia.
“O acúmulo de funções ou um nível de exigência muito alto em relação ao desempenho também podem gerar um estresse prolongado, que chamamos de síndrome de Burnout. Mas vale ressaltar que algumas pessoas são mais vulneráveis do que outras às doenças, por condições genéticas ou até mesmo por aspectos relacionados à personalidade”, assinala a psicóloga Luciana Silva Zanelato. Ela elenca ainda como quadros de saúde frequentes entre trabalhadores a síndrome de ansiedade, a insônia e a fadiga.
Segundo a especialista, o trabalho noturno também colabora para o aparecimento de desordens físicas e psicológicas, já que, neste caso, o organismo precisa trabalhar num período diverso do de sua natureza. “Fomos programados, ao longo do nosso processo evolutivo, para descansar à noite. Então, a qualidade do sono fica prejudicada para quem trabalha neste período, o que pode refletir no desempenho profissional e equilíbrio mental daquela pessoa”, frisa.
Chorava sozinho atrás do escudo’, diz vigilante que trabalha em banco
Há um mês o vigilante Evandro Antônio Deraco, 35 anos, conseguiu retornar ao trabalho. Após ser diagnosticado com depressão, ele permaneceu por quatro meses afastado de suas funções em uma instituição bancária da cidade para tratar da doença.
Ainda com alguma dificuldade de retomar sua rotina profissional, ele acabou assumindo um posto com o qual não precisa lidar com a clientela. “Ficar longe das pessoas é o que está me ajudando. Não sei o que seria se eu tivesse que conviver com gerente, gente reclamando de porta giratória”, comenta, dando sinais claros de que ainda não está completamente recuperado.
Antes de ser afastado, Deraco conta que sofria com crises de choro constantes durante a jornada e, sem forças para lutar contra aquela condição, tentava disfarçar o quanto podia. “Eu chorava sozinho, me escondendo atrás do escudo (que os vigilantes usam no trabalho). Ficava pensando o tempo todo que a agência seria invadida por ladrões. Chegava em casa e não queria conversar com ninguém, não tinha paciência com meus filhos e demorava para conseguir dormir”, relembra o vigilante, que está há quatro anos na profissão.
Assim como ele, de acordo com José Antonio de Sena, diretor-presidente do Sindicato dos Vigilantes de Bauru, há um grande número de profissionais da categoria afastados por doenças psiquiátricas na cidade. Por lidarem com a iminência de perigo constante, sofrem com maior tensão e estresse que os demais profissionais.
“Eles também são vítimas de problemas ortopédicos porque, muitas vezes, não podem descansar. Algumas empresas, por exemplo, obrigam os funcionários a trabalhar 12 horas em pé, enquanto deveriam dar direito a descanso de 10 minutos a cada hora. Eles não são máquinas”, reclama.
Além dos vigilantes, segundo a psicóloga Luciana Silva Zanelato, são mais suscetíveis aos problemas psiquiátricos os trabalhadores que desempenham funções burocráticas, como o setor administrativo, bem como profissionais da saúde, policiais militares, bombeiros, motoristas e professores.
Fonte: Jornal da Cidade – Bauru (SP)