Uma parte das saídas do mercado de trabalho se dá pela maternidade. Os primeiros anos de vida da criança demandam cuidados e atenção – que costumam sobrecarregar muito mais as mulheres do que os homens, principalmente durante a amamentação. Conciliar a vida pessoal, profissional e a maternidade, se tornou uma pauta constante, e por isso foi escolhida como tema da terceira matéria da série de reportagens sobre a mulher e o mercado de Trabalho.
A transformação dos papéis sociais e a desconstrução das concepções sociais de gênero contribuíram para consolidação feminina no mercado de trabalho. Com o passar dos anos, muitas prioridades mudaram para as mulheres, como por exemplo a de provedora e chefe de família, função antes atribuída ao sexo masculino. Entretanto, essas mudanças não foram acompanhadas de uma divisão mais justa das tarefas domésticas e de cuidados com a família, em especial dos filhos, que continuam sendo realizadas majoritariamente por mulheres.
Quando se trata do desenvolvimento infantil e da carreira profissional, é necessário ressignificar a maternidade e a paternidade. Pois é difícil pensar no equilíbrio entre trabalho e família, principalmente em igualdade de gênero no trabalho, sem que os homens assumam a sua parte no trabalho doméstico e nos cuidados com os filhos.
Na vida social, as mulheres são constantemente cobradas e julgadas com base em um padrão inalcançável de vida materna, que costuma ditar como uma mãe deve ser, agir e cuidar dos seus filhos. No entanto, cada experiência é única, como o nascimento de gêmeos, e a de um bebê prematuro. A idealização da maternidade influencia essa busca pela perfeição, sem considerar as limitações, o contexto socioeconômico, o desgaste e a sobrecarga, romantizadas pela figura de mulher guerreira com um instinto naturalmente maternal.
No mercado de trabalho, não é muito diferente, pois as mulheres são julgadas prévia e negativamente se são capazes de entregar resultados e manter o desempenho profissional enquanto cuidam de uma criança até mesmo antes de serem contratadas. Isso é refletido a partir dos preconceitos e dos casos de discriminação que acompanham a maternidade antes, durante e depois da gestação.
Faces da desigualdade
Apesar da legislação trabalhista assegurar a proteção da mulher e da criança nos primeiros meses da vida do bebê, ainda não há um regulamento que garanta a permanência da mulher no emprego depois da licença-maternidade. Estudo da Fundação Getúlio Vargas indica que 48% das mães ficam desempregadas nos primeiros 12 meses após terem seus filhos. A maior parte das demissões ocorreram sem justa causa e por iniciativa do empregador.
“A maternidade, os filhos e os afazeres domésticos ainda pesam mais sobre as mulheres e demandam mais flexibilidade. A cultura organizacional ainda promove os profissionais baseada em critérios masculinos, como estar totalmente disponível ao trabalho ou trabalhar várias horas”, analisou a pesquisa da FGV.
Esse impacto é absorvido principalmente por mulheres em situação de vulnerabilidade econômica, sobretudo as mães solo, que na ausência de renda, se submetem ao trabalho informal, isento das proteções trabalhistas previstas na CLT.
A servidora do TRT-10, Lívia Maia, mãe de dois filhos, conta que é “extremamente” desafiador cuidar da casa, dos bebês, trabalhar e estudar ao mesmo tempo, mesmo com auxílio paterno, ou de outras pessoas. “É fazer o que dá para ser feito, um pouquinho por dia. Muitas vezes você vai fazer só as coisas pela metade e aí é aprender a lidar com os vários pratinhos na vida e tentar equilibrá-los de uma forma que por mais que eles rodem devagar, eles não parem de girar”, define.
Dificuldades da reinserção
Além das inseguranças de retornar ao trabalho após a licença-maternidade, as mães ainda tem de lidar com conflitos internos, que poderiam ser minimizados com a existência de um ambiente de trabalho inclusivo, que forneça suporte como creches ou auxílio-creches; lactários; e que possibilitem o modelo de teletrabalho e uma rotina de horários mais flexíveis.
“A gente tem aquela ligação muito forte quando o filho é novinho. É como se demorasse para o cordão umbilical psicológico ser cortado”, relata Lívia. “É essa dicotomia, de você retornar às atividades que te fazem bem e que te preenchem como mulher e pessoa, e por outro lado você sentir aquela necessidade, aquela vontade de estar mais perto do seu filho nesse início da vida. Acho que ao mesmo tempo que você deseja retornar às suas atividades também há essa vontade de poder passar mais tempo com os bebês”, explica a servidora.
Agenda 2030
O combate à desigualdade de gênero e o empoderamento de mulheres e meninas é o objetivo nº 5 da Agenda 2030 – um plano de ação global da Organização das Nações Unidas (ONU), implementada no Judiciário a partir da Meta Nacional 9 do CNJ. A agenda reúne 17 objetivos de desenvolvimento sustentável (ODS) e 169 metas, que visam garantir os direitos humanos de todos.
Próxima reportagem
As matérias desta série serão divulgadas ao longo de todo o mês de março, semanalmente, sempre às terças-feiras. Na próxima semana, a quarta e última reportagem abordará a equidade e a igualdade de gênero. Acompanhe no site do Tribunal.
(Jeovana Carvalho)