Para Rodrigo Carelli, trabalhadores devem se sindicalizar para reivindicar direitos e reclamar de abusos. Dirigente do Sindicato dos Comerciários do DF diz que decisão do STF regulamentou retirada de direito
A decisão dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), que considerou a terceirização nas atividades-fim das empresas como uma forma de contratação lícita e constitucional, deu a questão uma amplitude ainda maior do que a reforma Trabalhista, que acabou com mais de 100 itens da CLT.
“Esse é o perigo” para os trabalhadores e trabalhadoras, afirma o procurador do Ministério Público do Trabalho (MPT) no Rio de Janeiro, Rodrigo Carelli.
Em Nota Técnica de março do ano passado, que analisou as condições de trabalho dos terceirizados, o Dieese já alertava sobre esses riscos. De acordo com os técnicos, permitir a terceirização em qualquer etapa da atividade produtiva das empresas, além de abrir as portas para a quarteirização, aprofunda a precarização das condições de trabalho e de remuneração.
Isso significa, diz o Dieese, que “poderá haver uma piora na própria distribuição de renda no país, além de aumento da insegurança entre os trabalhadores”.
O estudo feito pelo Dieese, em 2017, mostra que é duas vezes mais alto o total de registros de afastamentos por acidentes de trabalho nas atividades tipicamente terceirizadas do que nas tipicamente contratantes, ou seja, entre os trabalhadores contratados diretamente pelas empresas.
Diante de tantos riscos relacionados às condições de trabalho e à integridade física, tanto o procurador Rodrigo Carelli, que é também professor de Direito do Trabalho na Faculdade Nacional de Direito – UFRJ, quanto o diretor do Sindicato dos Comerciários do Distrito Federal, Luiz Saraiva (Luizinho), orientam os trabalhadores a se sindicalizarem.
Para Carelli, é recomendável que trabalhadores e trabalhadoras se sindicalizem para poderem, coletivamente, reivindicar direitos e reclamar contra abusos. Ele lembra que o MPT, também, está sempre de portas abertas para receber denúncias.
Segundo ele, apesar da decisão do STF, “ainda há meios de recorrer à Justiça. Se o trabalhador entender que foi lesionado por causa de suas tarefas, ele pode – e deve – buscar orientação no sindicato e no Ministério Público do Trabalho porque se houver uma fraude, há meios jurídicos sim de buscar reparação”.
Luizinho diz que os trabalhadores e as trabalhadoras precisam acompanhar a rotina dos seus sindicatos, para saber das agendas e orientações em relação à implementação dessas novas leis e estar atento a todas as ações que os dirigentes forem fazer para lutar por seus direitos.
O procurador do MPT explica que provavelmente haverá a construção de uma nova jurisprudência. Ele diz que a única coisa que se sabe até agora é que “vai acontecer um desastre humano”.
“Mas o tamanho dele [desastre humano] só poderá ser mensurado à medida que a nova lei chegar: se é uma terceirização de verdade aonde vai ter uma prestação de serviços em que haverá uma atividade especializada, ou se vai ser um vale-tudo de diversas formas de contratação que se voltará a um trabalho muito mais precário, em condições piores de trabalhos, acidentes e até mortes”, pontuou Rodrigo Carelli.
Para Luizinho, é difícil falar em questões como humanidade, quando o que se viu em Brasília foi um grupo de ministros votando sem, em nenhum momento, analisar a questão do ponto de vista dos trabalhadores e trabalhadoras brasileiros que já são exploradas todos os dias e que serão ainda mais.
Segundo o diretor do Sindicato dos Comerciários do Distrito Federal, os trabalhadores do comércio que já são bastante penalizados com jornadas exaustivas que precisam ser diariamente fiscalizadas pelos sindicatos da categoria porque os patrões descumprem os acordos coletivos, serão um dos mais prejudicados.
Além disso, diz o dirigente, os terceirizados têm salários e benefícios menores do que os trabalhadores diretamente contratados pelas empresas. Por isso, diz ele, a decisão do STF, deixa “a classe trabalhadora totalmente à mercê da gana de mais lucro dos patrões”.
Para Luizinho, que também é coordenador da sede administrativa da Confederação Nacional dos Trabalhadores no Comércio e Serviços (Contracs) no DF, “o Supremo regulamentou a retirada de direitos que, no caso específico do comércio, já são poucos.”
Estudo publicado pelo Dieese em março do ano passado comprovou, mais uma vez, que os terceirizados ganham menos e trabalham mais. De 2007 a 2014, a diferença entre os terceirizados e os contratados diretamente pelas empresas se manteve, em média, entre 23% e 27%. Em dezembro de 2014, a remuneração média nas atividades tipicamente contratantes era de R$ 2.639, enquanto nas atividades tipicamente terceirizadas era de R$ 2.021.
Em relação à jornada de trabalho, aponta o Dieese, 85,9% dos terceirizados trabalhavam entre 41 e 44 horas semanais, enquanto essa proporção era de 61,6% entre os contratados diretamente pelas empresas.